Intenção ou não de matar, resume caso




Intenção ou não de matar, resume caso
Pesquisa iconográfica
300 x 150 cm
Impressão laser laminada
2017
pesquisa em processo


Em 2017, iniciei esta pesquisa junto a um convite do pesquisador e curador Raphael Fonseca para a sua exposição no Centro Cultural São Paulo intitulada Bestiário, tema que me interessa que já tinha alguns trabalhos sobre. Em nossas conversas surgiu a lenda do Ipupiara que é o primeiro monstro relatado na historiografia nacional no século XVI. Ipupiara foi capturado, morto e exibido em praça público segundo o relato. De modo a cumprir um efeito simbólico sobre a comunidade, evidenciando a supremacia humana sobre este outro, o monstro.

Na cidade de São Vicente, litoral de São Paulo, desde os anos 80 havia uma estatua réplica do Ipupiara. No entanto, em Fevereiro de 2016 durante uma madrugada, alguém decide por jogar gasolina e queimar a estátua, destruindo-a completamente, restando apenas uma ínfima parte da estátua de bronze. O que mais me chamou a atenção foi o ato de queimar a estatua, de pensar, o quanto esta imagem, supostamente ficcional, monstruosa, em 2016 ainda é capaz de gerar repulsa, ódio e recusa. E extingui-la por meio do fogo é bastante simbólico e sintomático. A imagem poderia ter sido danificada de vários modos, no entanto, o método escolhido foi queimá-la, deixa-la se desfazer lentamente para que não restasse nada de seus contornos, do seu símbolo. Assim, iniciei uma pesquisa iconográfica ,ainda em processo, sobre corpos que queimam. Comecei a juntar imagens de vários corpos monstruosos e não-monstruosos queimados ao longo da história, construindo assim um paralelo entre todas estas imagens. Uma espécie do mosaico do fogo, a sua potência e suas vítimas a partir da Ipupiara e da sua destruição silenciosa realizada a noite. A chama do fogo intermitente também como uma metáfora da história e do desejo, fragmentada, iluminada e arruinada.








Como escrevi acima, o ato de queimar da estátua me intrigou profundamente, o que me remeteu passagem do livro Anéis de Saturno do escritor W.G Sebald, uma grande referência para meu trabalho.

by the seventeeth century, only a few insignificant remains of the erstwhile forests survived in the islands, most of them untended and decaying. The great fires were now lit on the other side of the ocean.

It is not for nothing that Brazil owes its name to the French word for charcoal. Our spread over the earth was fuelled by reducing the higher species of vegetation to charcoal, by incessantly burning whatever would burn.


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Combustion is the hidden principle behind every artefact we create. The making of a fish hook, manufacture of a china cup, or production of a television programme, all depend on the same process of combustion. Like our bodies and like our desires, the machines we have devised are possessed of a heart which is slowly reduced to embers

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Sebald traz uma das hipóteses para o nome do Brasil a partir da palavra francesa Brasée; do carvão, da brasa. Portanto, Brasil seria este lugar simbólico e físico que arde, que queima, junto com a história e a própria história da arte.

obs: O título do trabalho Intenção ou não de matar, resume caso se refere um título de uma matéria veiculado pelo correio braziliense durante a morte do índio Galdino devido aos ferimentos causados pelo fogo.







Imagens da primeira montagem do trabalho com um caráter bastante iconográfico na exposição Bestiário organizada pelo curador e pesquisador Raphael Fonseca no Centro Cultural São Paulo 2018. A pesquisa se mantém e em 2020 uma nova montagem será feita